"Seu dia já começa em falso. Você pisa naquilo que não vê, você passa por aquilo que não te interessa, mas te completa. Você é um esterótipo, você tem todos. Nem mesmo os deuses saberiam te definir, pois tens uma consciência geniosa, cheia de ideias que parecem encantar, mas não são nada além daquilo que você não é. Gostas de atenção. Ama os olhares. Mas não sabes tu que a vida só te olha porque tu a chama, porque tu sempre foi apenas mais uma entre os grãos, com vontade e sede de destaque.
   Dizima teu inimigo, ama o teu amigo, estraçalha os tão perto de ti, de modo que se arrastem a teus pés. Não aceita o não, tua vida é o sim. Se te vires em situação contrária, pobres dos que do outro lado estão! A piedade não está em ti, está nas tuas ideias. Tem uma vida lixo, tão cheia de todos, mas tão vazia de tudo. Arrasa nas ruas, nas praias, nas esquinas, nos cabarets, para inclusive estar sozinha em teu mundo.
   Tu não olhas o espelho nas manhãs frias. Se olhasse, veria um ser irascível e incompreensível, sem amor e quase sem vida. A tua tempestade está à vista de todos nós. Não enganas, não reclamas, não encantas. É apenas mais um protótipo da sociedade em que vive. Sai e se diverte, bebe, beija, transa, repele, encanta, exausta, volta para casa e chora. Porque você se esconde de todos, mas não se esconde de si mesma. Tem vergonha de se olhar e ver que mudou desde quando se perdeu, e que perdeu seus amigos desde que mudou. E que agora tem olhares temerosos vestidos de admiração, vozes sussurrantes nas sombras atrás de você.
   A vida tranquila que não escolheu passou. Sofra em tudo, sofra porque já fez outros sofrerem, sofra porque nunca se importou de verdade. Nada espero de ti, porque não se tem nada que esperar de uma concha vazia no infinto amargo do mar."